Publicado 9 de junho de 2020 19:53. última modificação 9 de junho de 2020 19:53.

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Pense Brasil debate pautas sociais para o período pós-pandemia

Com o objetivo de discutir uma agenda coletiva com grandes personalidades brasileiras, o Pense Brasil Virtual chega à sétima edição com o tema “Pautas sociais para uma nova hegemonia: Estado do Bem-Estar, Educação, Saúde, Cultura, Trabalho e Renda”. Realizado pela Fundação João Mangabeira (FJM), do Partido Socialista Brasileiro (PSB), o debate desta segunda-feira, 8, contou com a moderação do ex-governador e presidente da Fundação João Mangabeira Ricardo Coutinho, a presença do ex-governador e ex-senador João Capiberibe (PSB-AP), que é autor da Lei da Transparência, LC 131/2009 e Vice-Presidente Nacional do PSB; da Professora Marta Arretche, do Departamento de Ciência Política da USP e diretora do Centro de Estudos da Metrópole; e do sociólogo Cesar Callegari, presidente do Instituto Brasileiro de Sociologia Aplicada e ex-secretário de Educação da cidade de São Paulo.  

O Pense Brasil com a Pandemia


O presidente da Fundação explicou que o ciclo de debates teve uma primeira etapa com quatro edições presenciais, no período pré-pandemia, e mais seis edições digitais realizadas já durante o período de isolamento social para pensar o país e o mundo dentro da crise da covid-19. “Agora inicia-se a terceira etapa, para discutir como o mundo e o Brasil podem se reorganizar a partir desse evento que naturalmente quebrou uma lógica estabelecida em uma série de fatores na sociedade. E que de certa forma assustou muita gente não só pela ferocidade da doença mas também pela desarticulação do modo de vida predominante que existia até então”, ressalta.

Brasil: uma democracia frágil

Além da pandemia, a defesa da democracia é um desafio enorme que estamos enfrentando hoje, e para a professora Marta Arretche não há dúvidas de que setores da sociedade têm se declarado abertamente contra a democracia, inclusive o presidente da república, que faz declarações muito graves na direção de ferir princípios democráticos e para além da crise sanitária e econômica que vivemos e que certamente iremos enfrentar por algum tempo. “O que nos celebrará no futuro depende do que fizermos agora e do modo como pudermos resolver a convocação ao conflito que o presidente vem lamentavelmente fazendo de modo sistemático. Penso que há sinais promissores na questão da formação de uma frente democrática que reúna setores da sociedade brasileira que têm visões diferentes sobre questões econômicas e agenda social, mas que têm posições comuns em relação à necessidade de preservarmos o sistema democrático, o Estado de Direito, o respeito à lei e às instituições. Não está garantido que isso vá acontecer e dependerá da capacidade das forças democráticas forjarem uma ampla aliança nesse momento, para fazer frente aos riscos do autoritarismo e do controle da informação”, aponta Marta.

“Não estamos sozinhos nessa situação, e no mundo inteiro parece que saíram do armário forças altamente reacionárias e conservadoras”, lembra o sociólogo Cesar Callegari. “A emergência dessas forças é resposta a um processo muito intenso de transformações que estamos vivendo com o surgimento de novas tecnologias, modificações nas relações de produção e o colapso dos sistemas tradicionais de representação política, de classes e de grupos, que têm sido colocados em xeque. Nesse conjunto de mudanças vertiginosas há uma reação, e é uma reação do passado. Por isso é conservadora, no sentido de buscar de uma maneira saudosista os valores e as instituições do passado, sendo assim excludente, racista, xenofóbica e ultranacionalista”, explica. 

Nesse contexto de extrema ameaça autoritária que vivemos, Callegari vê a possibilidade de abrirmos uma perspectiva nova para o país, uma vez que esses regimes reacionários, autoritários, negacionistas e excludentes não têm nenhum projeto de desenvolvimento com democracia e com justiça social. “Abre-se assim a chance de construirmos uma grande frente democrática que, além da defesa da democracia, possa também criar uma agenda progressista mínima que dê uma resposta efetiva aos grandes problemas brasileiros em conexão com os grandes problemas mundiais”. 

O ex-governador e ex-senador João Capiberibe lembrou que o Brasil colonial fundamentou seu desenvolvimento na dependência externa, na pilhagem de nossos recursos ambientais e na exclusão social. “O grande salto, e o grande marco civilizatório no país foi a constituição de 88, que estabeleceu a seguridade social, e apesar de ainda ter mantido uma série de injustiças, esparramou direitos a brasileiros que jamais sonharam ter um um auxílio do Estado à Saúde, por exemplo”, diz Capiberibe. Ele também destacou que nos últimos quatro anos houve uma sistemática demolição dos direitos dos trabalhadores e também da Constituição de 88. “Agora, o futuro depende da nossa capacidade de utilizar as novas tecnologias e a comunicação digital em redes do mesmo jeito que essas redes sociais foram instrumentos importantes para difundir ódio, enganar as pessoas e eleger Jair Bolsonaro, que representa essa elite arrogante que organizou o país para eles”.

A política como caminho

Marta Arretche conclui que a saída não é fácil, porém há luz no fim do túnel à medida em que democratas e setores progressistas sejam capazes de reconhecer a gravidade da situação que estamos vivendo e dos enormes desafios que estão colocados para o Brasil, para assim unirmos forças em torno de uma pauta comum que minimize o tempo de sofrimento que temos pela frente. “Não devemos alimentar ilusões: não há solução fácil para o que estamos enfrentando e as grandes lideranças políticas são aquelas que são capazes de reconhecer e assumir que não há solução fácil”, comenta. “O curioso é que as pesquisas de opinião no mundo todo estão mostrando que os líderes políticos recomendaram o isolamento e foram capazes de reconhecer a gravidade da pandemia aumentaram suas taxas de aprovação porque a população se sentiu protegida pela coragem dos líderes políticos que foram capazes de apresentar a má notícia”, conta. Por fim, a professora espera que sejamos capazes de passar por cima das nossas divergências em favor de um bem maior.

César Callegari ressalta que nesse instante existe uma tarefa de resistência em termos de construção de uma frente ampla e democrática. “Por não ter projeto de desenvolvimento do país, hoje a única alternativa do governo Bolsonaro é utilizar a violência como meio de coesão de sua base. Temos que compreender isso e portanto compreender a enorme e importantíssima tarefa de fazer o que fizemos na época da ditadura militar, que é ter a grandeza de construir uma frente ampla, ter a capacidade de unir diversos. Não basta resistir, é muito importante que se apresente sem medo algo concreto ao povo brasileiro. É esse o grande desafio”, conclui Callegari

Ricardo Coutinho lembrou então da capacidade de João Capiberibe em construir alianças políticas diversas para obter vitórias em temas de interesse nacional. Isto posto, Capiberibe contou sobre suas reuniões com representantes da base da sociedade para combater a exclusão política, encontros que após a pademia se tornaram virtuais. “Em nossas reuniões físicas e atualmente em nossas videoconferências a comunidade tem percebido que ela pode exercer controle social. Então o cenário de futuro para nossa sociedade vai depender da nossa capacidade de mobilização da cidadania para o exercício do controle social e do controle do Estado. Minha visão pode ser um pouco utópica, mas não vejo saída fora da nossa habilidade de estimular a sociedade em busca de um caminho em que possamos ter um povo consciente politicamente e capaz de fazer a mudança que todos nós queremos para esse país”. Ricardo Coutinho concordou com Capiberibe e questionou sobre o que seria da humanidade se não fossem as utopias. “São elas que nos impulsionam e que fazem com que caminhemos adiante”, concluiu o presidente da Fundação, agradecendo a todos os participantes e atestando a boa fluidez durante o debate da noite. 

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