Dirigentes do PSB discutem formas de reabilitar a política
Em novo seminário da Fundação João Mangabeira, os participantes debatem sobre a importância da autocrítica
Nem todo mundo no chamado campo progressista se dispõe a fazer autocrítica. Não é o caso do PSB. Em mais uma etapa do ciclo de seminários da Fundação João Mangabeira, think thank da legenda, desta vez em Brasília, o presidente do partido, Carlos Siqueira, foi direto ao tentar decifrar como o País chegou a este ponto. “O que fracassou foi a política”, afirmou. “Mas é momentâneo, podemos recuperá-la. Para isso, precisamos admitir nossos erros, que não foram poucos, inclusive nos períodos de governos que ajudamos a eleger. Nosso período de construção democrática é uma gota no oceano da história brasileira.”
Após discutir, em São Paulo, os caminhos para melhorar a educação, o PSB debateu, na terça-feira 16, em Brasília, o tema “Estado de Direito e Democracia”. Além de expoentes do partido, participaram do seminário economistas, jornalistas, juristas e ativistas sociais. A intenção do partido é realizar colóquios mensais em diferentes cidades para discutir temas centrais de um projeto nacional. A próxima etapa do “Pense Brasil” será no Recife. A íntegra do evento na capital federal pode ser encontrada nas páginas do Facebook da Fundação João Mangabeira e de CartaCapital, veículo parceiro de mídia.
O líder da oposição na Câmara, Alessandro Molon, enfatizou a importância de se ampliar o diálogo com a sociedade. “As pessoas estão anestesiadas e ainda não entenderam as perdas que terão com a reforma da Previdência. O tema é muito técnico, árido. É essencial continuarmos explicando o que está em jogo.” A “ficha” da sociedade, acredita o deputado, ainda vai demorar a cair. “Só vai acontecer quando as pessoas forem ao INSS pedir aposentadoria. Aí eu tenho certeza que vai mudar.”
Rodrigo Rollemberg, ex-governador do Distrito Federal, corroborou a opinião de Siqueira. Para ele, os políticos precisam recuperar a credibilidade. “A população necessita de uma representação coerente. Se os partidos não tiverem uma posição sobre os temas fundamentais da vida cotidiana, eles se reduzirão a cabides de cargos públicos e mandatos. Nós temos um governo com uma parcela significativa de apoio popular. Um apoio muito bem manipulado, pois uma população que vai às ruas pretensamente defender algo como a reforma da Previdência não tem a menor ideia do que está fazendo.”
[quote]“Precisamos recuperar a credibilidade. A população necessita de uma representação coerente”, afirmou o ex-governador Rodrigo Rollemberg[/quote]
O presidenciável Guilherme Boulos, do PSOL, defendeu a união dos partidos de oposição para conter a escalada do autoritarismo. “Precisamos superar a visão desesperada e desesperançosa. Não podemos cair nesta de achar que os 58 milhões de eleitores de Bolsonaro no segundo turno concordam com as ideias mais bizarras que ele defende. Esses eleitores votaram quase como um grito de desespero. Bolsonaro valeu-se das crises da segurança pública, econômica e de representação democrática, o que gerou um sentimento de antipolítica, aprofundado pela Operação Lava Jato, mas já existente.”
Ao citar as denúncias publicadas pelo site The Intercept Brasil, o ex-ministro do Superior Tribunal de Justiça Gilson Dipp não poupou críticas à Operação Lava Jato. “Lendo tudo isso, e até que não me digam claramente que isso é mentira, o benefício da dúvida passa a ser ao contrário. E eu conheço os personagens envolvidos. Lendo todos esses diálogos, eu digo que o maior inimigo da Lava Jato foi o ministro Teori Zavascki. Eles tinham medo do Teori, e com razão. Apesar de Teori, que Deus o tenha, não ter feito, às vezes, aquilo que poderia ter feito. E talvez tivesse feito, passado aquele momento de turbulência.”
Dipp ainda colocou em xeque a montanha de delações premiadas. “É possível que uma empresa como a Odebrecht faça 80 delações premiadas? O que 80 delações de diretores vão acrescentar uma à outra? A lei refere que a homologação da declaração premiada pelo magistrado é muito singela e deve ser feita apenas revisando os requisitos formais: se houve voluntariedade do delator, se houve a legalidade. Enfim, aspectos formais que não podem adentrar no mérito. São 80 delações que foram homologadas em cinco dias, após a morte de Teori, no recesso Judiciário, pela então presidente do STF, Cármen Lúcia. É possível homologar 80 processos em cinco dias, mesmo que sejam examinados apenas aspectos mais formais? É impossível. E aí o Judiciário peca também e é conivente com o que acontece.”
O pesadelo das fake news na construção sistemática da desinformação e o papel dos meios de comunicação e das redes sociais foram citados por todos os debatedores. A jornalista Helena Chagas ressaltou a influência da mídia na desmoralização da política. “A corrupção precisa ser investigada e apurada, mas é óbvio que a cobertura da Lava Jato passou do ponto, com excessos e direcionamentos. Isso teve repercussão direta nas eleições. Os políticos vinham num desgaste crescente nos últimos anos por responsabilidade deles mesmos, porém, foi criado um clima de terra arrasada, de que a política é uma atividade de gente corrupta.”
O seminário contou ainda com a participação do economista Luiz Gonzaga Belluzzo, do ex-governador da Paraíba Ricardo Coutinho, da deputada Lídice da Mata e do jornalista Luis Nassif.
Fonte: CartaCapital