Indústria em queda livre
02/10/2015
A indústria brasileira agoniza. Sem uma política de governo estruturante, a matriz industrial do Brasil perde competitividade e compromete um setor que está no topo da cadeia produtiva de qualquer nação que busca a soberania plena com destaque no cenário mundial. A indústria demanda insumos de todos os setores e oferece produto para todos eles aquecendo o mercado, gerando emprego e contribuindo para a estabilidade do crescimento econômico.
Qualquer que seja o ponto de vista adotado — participação no produto interno bruto (PIB), percentual de empregos criados, crescimento do valor da transformação industrial (VTI), comparação com o desempenho mundial –, o Brasil está se desindustrializando. Esse cenário sombrio e real motivou a Fundação João Mangabeira a apresentar no segundo boletim Conjuntura Brasil, uma radiografia do processo industrial no país, e concluímos que a desindustrialização é o principal fator de difusão da recessão econômica que se impõe neste momento.
Em meados da década de 1980, a indústria representava 36% do nosso PIB. Hoje, representa 14% e se compara ao percentual da primeira metade da década de 1940. A indústria de transformação, a de alta intensidade tecnológica, de média intensidade e de baixa intensidade, todas sofreram reduções drásticas comprometendo nossa competividade e trazendo reflexos negativos. A queda é generalizada atingindo 13 das 15 regiões pesquisadas pelo IBGE.
Nossa indústria, que já foi superavitária na relação com o mundo, passou a ter impacto negativo na balança comercial. É nítido o descompasso com os padrões globais: entre 1986 e 2014, a participação da indústria brasileira na produção industrial mundial caiu de 2,5% para 1,6%. Se considerarmos apenas o primeiro semestre de 2015, levamos, como vimos, um tombo de 8,3%, se comparado com o mesmo período do ano anterior, enquanto a produção industrial aumentava 2,8%, na média do mundo.
Há muito se sabe que um prolongado período de valorização cambial, em um contexto de abertura comercial e financeira, anula os possíveis efeitos das políticas industriais e tem impacto negativo profundo sobre a estrutura produtiva do país. A cadeia dos setores intensivos em tecnologia e capital perde densidade. A indústria, como um todo, tende a se concentrar mais na finalização de produtos, pois nesses casos os componentes importados são quase iguais ao produto final.
Só se mantêm competitivos os setores em que o país tem enorme vantagem comparativa, ou seja, basicamente os produtores de bens primários e de algumas commodities (o setor de serviços é preservado porque, em geral, não sofre concorrência externa). A pauta de exportações regride em direção aos bens primários. Hoje, dos 20 produtos mais importantes, que correspondem a mais de 50% das nossas vendas externas, apenas dois têm alta densidade tecnológica. A relação entre desindustrialização e sobrevalorização cambial tem suporte empírico no Brasil recente. Com mais esse documento, a Fundação João Mangabeira cumpre sua função de contribuir para o debate de políticas públicas que orientam nossos parlamentares e toda a sociedade brasileira na construção de caminhos que tragam mais qualidade de vida à população.
Renato Casagande,
Ex-governador do Espírito Santo, é presidente da Fundação João Mangabeira
Autor: Renato Casagrande
Veículo: Correio Braziliense